sexta-feira, 6 de fevereiro de 2009

Reflexões na Churrascaria

Numa quinta-feira, assim, do nada, sem o menor aviso prévio, fui acometida por um avassalador desejo carnal... de comer carne, bem entendido.


Não um bife qualquer, um strogonoff ou um ensopado. Minha porção mulher das cavernas queria um churrasco. Não vou dizer que “queria sangue”, porque nunca gostei de carne malpassada, aquela coisa de comer boi quase vivo, da picanha sangrando. Mas minha boca se enchia de água só de pensar num espeto corrido.
– Que coisa mais fora de hora!
Como se dentro de nosso estômago houvesse dia e noite e também relógio para que ele soubesse o horário das refeições.


Aquele pensamento foi se avolumando dentro da minha cabeça: “carne, carne, carne” e, como um polvo, foi me envolvendo com seus tentáculos.
– Quer saber? Disse para mim mesma, que venha o touro, quero dizer, o boi. Está decidido! Vou a uma churrascaria agora.
Já que eu não havia nenhum Piteco disponível, aquele personagem pré-histórico dos gibis do Mauricio de Sousa, então eu teria que bancar a Tula e providenciar o meu mamute para o almoço.


No lado da cidade onde eu me encontrava, existia um estabelecimento em que eu nunca havia estado anteriormente, mas do qual já tinha tido boas referências. Foi para lá que me dirigi ansiando por uma orgia gastronômica.
Para um dia de semana, naquele horário estranho, afinal já era uma e meia, o restaurante estava praticamente cheio.
A casa era decorada como um rancho, com cabeças de boi, acordeons, laços, boleadeiras, fotos e gravuras de cavalos e de gaúchos, que pretendiam remeter memórias aos pampas do Sul.
No centro o já tradicional bufê de saladas e pratos quentes.
Alguns destes bastante fora do lugar, pois o que faz uma moqueca de peixe numa churrascaria? Agora virou moda, mas sushi... Tem coisa mais descombinada do que sushi e churrasco?


Dei uma passada rápida em volta do bufê, afinal eu não fora lá para comer alface e muito menos a esquisita moqueca. Munida de farofa, um corajoso pastel, com certeza absoluta recheado com sobras das carnes assadas, e um pedaço de polenta, voltei ao meu lugar e esperei os espetos começarem a correr. Ou não é por isso que chamam espeto corrido? Ah! Sorry, agora é rodízio. Espetos corridos são em beira de estrada, para caminhoneiros... Qual é a diferença entre um e outro? Caminhoneiro é diferente de gente da cidade? Deixa prá lá... Devo estar sendo acometida por algum “delirious carnis”.


– Aceita filé argentino?
– Oba! Foi dada a largada...
Não sei como os garçons fazem para escolher sempre o pior pedaço para pôr no meu prato. O tal filé estava bem saboroso, tirando fora os nervos e a gordura.
Veio costela, mais ou menos; picanha, ruim; fraldinha, horrível; cupim, estava bom, pois era um monte de gordura, mas, quando resolvi repetir, me arrependi; deveria ter permanecido com a lembrança do primeiro pedaço. O carneiro, que adoro, devia ser um bode velho, tão duro que estava, mesmo um não tendo parentesco algum com o outro.


Massas, outra combinação esdrúxula em churrascaria, tão esquisita quanto pizza com ketchup, mas tem gente que a-do-ra, fazer o quê? E vinham os cannelloni, rondelli, spaghetti, os muito estranhos gnocchi fritos acompanhados de molhos de aparência suspeita. Diante daquela que é a preferida por nove entre dez pseudo-ítalo-brasileiros, a tal da lasagna à bolonhesa, decidi me aventurar pelo mundo dos conchiglioni recheados com abóbora e me arrependi na primeira bocada. Tentei ainda a segunda, pois sou teimosa: “incomível”! Tradução: impossível de comer.


Constatei que não me havia sido oferecido, em nenhum momento, aquilo que, junto com o coração de frango, é de praxe, os dois espetos iniciais em qualquer churrascaria que se preze.
– Falta alguma coisa?
– Falta sim, lingüiça. Quero dizer, não passou o espeto de lingüiça.
– Vou providenciar.


Enquanto aguardava a tomada de providência do rapaz, deixei de olhar para o prato, que fora até aquele momento o foco de toda a minha atenção, e percorri o salão com os olhos até onde pude alcançar, sem ter que fazer nenhum esforço de virar a cabeça para onde quer que fosse.
Comecei observar os freqüentadores do local, que até então haviam estado ofuscados pelo meu maior interesse, que eram as carnes que eu estivera me esforçando para comer.


À minha frente eu via cerca de quinze, dezesseis mesas com quatro lugares cada. Todas estavam ocupadas. Percebi um fato curioso: nessas mesas que eu podia enxergar, encontravam-se sentados, de modo geral, duas, três ou quatro pessoas.
Dois homens ou um homem e uma mulher; dois homens e uma mulher ou duas mulheres e um homem, quatro homens. A curiosidade era que três mesas com uma só pessoa eram ocupadas por mulheres, inclusive a minha. Não tinha uma mesa com um homem almoçando desacompanhado.
Fiquei intrigada e resolvi espichar o pescoço e dar uma geral no restaurante todo. Vi conchiglioni pavorosos que pareciam haver saído de um filme de terror, pois boiavam numa calda grossa de chocolate. Fiquei enjoada...
Mas nenhum homem curtindo sua própria companhia.


Meditei sobre o caso enquanto aguardava as ditas lingüiças.
Será que homens não vão a churrascarias sozinhos em dia de semana?
Homens não gostam de comer sós?
Mulheres não se importam, nós estamos na nossa. Vamos aonde queremos, comemos o que desejamos (desde que tragam as benditas lingüiças...), não nos importamos se estamos sentadas sós ou acompanhadas.
Basta ver que os homens, quando se separam, vão para onde? Casa da mamãe.
As mulheres? Ralam, mas vão se virar sozinhas bem longe das asas maternas.
Filosofava intrigada quando minha vizinha da mesa à frente se mexeu para pedir a conta. Fiquei um tanto quanto ofuscada com o brilho das lantejoulas e o colorido da sua roupa.
– Já é Carnaval? Faz quanto tempo assim que estou aqui esperando por esse espeto de lingüiças?


Resolvi desistir e pedi a conta. Foi me oferecido um cafezinho para compensar a falta da lingüiça. Ora, vejam só, desde quando um cafezinho serve como substituto de lingüiça, mas vá lá, vou fingir que acredito. E também como se eu não soubesse que o cafezinho é para todos e não só para os sem-lingüiças.


Como gosto daqueles cafés bem sem-vergonha, fraquinhos, ainda perguntei se era café de máquina temendo a possibilidade, ainda que remota, de vir um expresso.
– É café normal, esclareceu o garçom.
Mesmo para mim, uma criatura sem nenhuma cultura cafeeira, pois tomo água suja como café, aquilo era muito ruim. Desisti do café.
Fiz como a raposa e as uvas... No final das contas as lingüiças poderiam ser ruins como todo o resto... As lingüiças estavam verdes.
Mas, de qualquer forma, não vale a pena chorar sobre a lingüiça derramada.


Ninguém informou para o Word que houve uma mudança ortográfica, portanto a lingüiça dele vai continuar tendo trema. Eu é que não vou me meter a besta de ficar tirando trema da lingüiça de ninguém.

22 de janeiro de 2009

3 comentários:

  1. Tô voltando, tô voltando...
    Depois daquela doença misteriosa de não conseguir ler/escrever emails, comentários, etc, tô voltando.

    Preciso ver o negócio dos espaços! Assim sem parágrafo fica difícil para meus olhos cansados. Sou quase uma quarentona!!!

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  2. Ah! E ainda não consegui ler esse inteiro...
    Mas volto!

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  3. Está vendo o que acontece com esses parágrafos desconfigurados? Seres humanos sem olhos de gatos não conseguem ler...Socorro! Quem souber como fazer eles voltarem ao normal avisem, pois um belo dia amanheceram assim...e minha amiga quarentona não dá conta do recado!!!

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Afinal eu poderia estar caçando ratos, não é mesmo?