quarta-feira, 7 de abril de 2010

Despertar de outono



Ela acabara de acordar. Gostava de dormir com as janelas abertas, sem cortinas escuras, sem venezianas, sem nada que a impedisse de ver a luz do dia.
Assim que abriu seus olhos preguiçosamente, vislumbrou o céu muito azul. Sentiu então a brisa fresca de um agradável dia de outono.

Quando mais nova, gostava muito do verão. Agora aquele calor lhe desagradava. E pensar que por tantos anos seguidos se dirigia à praia juntamente com muitos outros e se esticava ao sol horas a fio. Quando o calor chegava às raias de se tornar insuportável, mergulhava nas águas poluídas do Atlântico.
Ao terminar a “temporada de verão”, tentava recuperar a pele envelhecida prematuramente, os cabelos ressecados, as micoses das unhas...

Sem contar também o desconforto, pois, por melhor que fosse o apartamento onde permanecia, não era a sua casa. Não tinha o seu cheiro nem o seu jeito. A água do chuveiro não tinha sequer a pressão e a temperatura certas. Na cozinha sempre faltava uma panela ou um recipiente do tamanho adequado para suas receitas de rompante.

E o calor! E a preguiça e a indolência! Se ia para a rua, suava, ficava pegajosa e se encontrava com outras pessoas também suadas e pegajosas. Ou, pior, se encontrava com alguma criatura desagradável... e com quem, não tendo muito espaço para desviar sem ser notada, era obrigada, graças à educação recebida pelo colégio de freiras, a ser hipocritamente agradável:

– Nossa, há quanto tempo não te via... (Se você soubesse quantas vezes fingi não te ver...)
– Como você está bem! (Mentira é um pecado muito feio!)
– E as criancinhas, como vão? (Que Deus me livre daqueles diabinhos sem educação...)
– Vamos, sim, nos encontrar... (No dia de São Nunca!)

Por essas e por outras, desistiu das tais férias de verão. Com o passar do tempo aprendera a ser seletiva e não dar tanta atenção para aquilo que os outros fazem, dizem ou pensam.

Sentia um imenso prazer em se espreguiçar quando acordava. Adorava o contato dos seus pés e pernas com o algodão dos lençóis. Que sensação maravilhosa poder sentir essa brisa fresca da manhã entrando pela janela e poder se enrolar em seu acolchoado de penas mais um pouquinho, até a hora de se levantar.

Hoje é um novo dia. Espreguiça pela última vez. Está pronta para recomeçar uma vez mais.

Um comentário:

Tenho interesse em saber sua opinião sobre meus textos.
Afinal eu poderia estar caçando ratos, não é mesmo?