segunda-feira, 23 de novembro de 2009

Ora, pipocas...






Na rua o calor era dantesco, enquanto ali, no interior da loja, alguém havia errado a mão na hora de regular o ar-condicionado.
Ao abrir a porta para entrar, o cliente era saudado por uma lufada de vento polar. De qualquer forma as pessoas preferiam permanecer no polo esperando para serem atendidas do que enfrentar o que quer que fosse lá fora, naquele calor infernal.

Encostado na coluna, ele enfiava a mão no cartucho de papel parado, retirava alguns grãos de pipoca e, com um olhar bem distante (decerto vislumbrava ao longe seu iglu, doce iglu), ia mastigando vagarosamente. Nem bem acabava aquele bocado, a mão já estava de novo dentro do saco em busca de uma nova porção, num gesto mecânico e repetitivo.
A mulher que o acompanhava estava grávida e encontrava-se parada um pouco a sua frente. Usava um vestido de malha justo, que marcava bem sua enorme barriga saliente e seu umbigo saltado. A filha deles, de cerca de sete anos, corria para cá e para lá impaciente com a demora.

“Idosos, gestantes, lactentes, mulheres com crianças pequenas e pessoas com necessidades especiais terão preferência no atendimento”, dizia o cartaz. Mas todos os atendentes já estavam ocupados. Com certeza eles seriam os próximos.

A menina, entre uma corrida e outra, vinha para perto dos pais, servia-se de um punhado de pipocas e continuava a correr desatinadamente, derrubando um tanto delas pelo chão de granito da assistência técnica de telefones celulares.

A moça, sem tem nada o que fazer, a não ser esperar em pé naquela fila, distraidamente, começou imitar o marido e serviu-se de um grão de pipocas.
Mais outro.
Certamente movida pelo tédio, sem uma palavra apoderou-se do cartucho, tirando-o das mãos do marido.

A fila não andava.

Ela delicadamente comeu um grão de pipoca de cada vez.


A barriga marcada pelo vestido de malha era descomunal. Era ela que estava muito grávida ou era o vestido que dava aquele efeito de enormidade?

Um desajeitado servente veio repor o galão de água. Não foi feliz ao tentar encaixá-lo em seu suporte, molhando uma boa parte da loja e desperdiçando o precioso líquido. Sem perceber o seu erro, foi embora, dando sua missão como cumprida.

A barriga... a barriga naquele vestido de malha era algo que impressionava. Talvez nem fosse ela por si só, mas o umbigo saltado, apontando para fora.
Ou os dois...
Ela continuava comendo pipocas, um grão de cada vez.


Um grão.


Um grão a mais...


O derradeiro grão foi que causou o pandemônio.
A menina parou de correr estarrecida. O pai voltou de supetão da viagem que estivera fazendo.
Tal qual uma bexiga em festa de criança, o barrigão explodiu, jorrando água por todo lado.
Água essa que veio juntar-se àquela derramada pelo galão, molhando praticamente todo o chão de granito da assistência técnica de telefones celulares.

Uma gravação repetia sem parar: “Celular fora da área de serviço ou desligado.” Os aparelhos que ali se encontravam, por não funcionarem a contento, entraram em curto e deixaram de funcionar definitivamente.

Janeiro de 2008

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Afinal eu poderia estar caçando ratos, não é mesmo?